A Forma da Água, o novo filme de Guillermo Del Toro, autor de obras como A Espinha do Diabo, O Labirinto do Fauno, Círculo de Fogo e duas aclamadas adaptações da HQ Hellboy, finalmente chega aos nossos cinemas e chega com uma bagagem de 13 indicações ao Oscar desse ano e ovacionado pela critica internacional. As expectativas em relação à história de Elisa, uma jovem faxineira muda que acaba se envolvendo com uma criatura aquática presa numa estação de pesquisas militares, durante nos primeiros da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a antiga União Soviética, estão altíssimas e nós do Multiversos assistimos e vamos falar um pouco aqui sobre o longa.
Desde a primeira cena, o filme mostra-se singular. O design de produção está perfeito na reconstrução de uma América que buscava e respirava glamour, ao mesmo tempo que alguns elementos noir permeavam os ambientes. As cenas urbanas no mais puro Norman Rockwell, os laboratórios vindos direto de ficções cientificas pulp com toques de steampunk, penteados e paletós alinhados, tudo milimetricamente recriado. A fotografia utilizando-se muito bem de uma paleta de cores que vai do uso perene do verde e seus tons amarelados e cianos com um contra-ponto em amarelo, mostra muito bem toda a história em planos médios e closes e alguns poucos planos abertos. Aqui cada angulo remete a uma sensação ou sentimento. Nenhum momento na tela é desprovido de emoção, e tudo isso é embalado por uma trilha sonora perfeita, com o fino da bossa musical do período e também por temas perfeitos para cada momento.
Toda essa emoção é o que move os personagens. Elisa (Sally Hawkins) é muda e muito discreta, mas nos momentos em que está ao lado de sua amiga de trabalho, a sempre comunicativa Zelda (Octavia Spencer) ou de seu vizinho, o ilustrador Giles (Richard Jenkins), um artista que se encontra no limiar de sua carreira, devido à idade e ao surgimento de novas tecnologias, ela fica mais à vontade. Com esses personagens dentro de uma sociedade que os considera desajustados, o roteiro original de Vanesa Taylor e de Del Toro acerta em usar o tempo de forma coesa para criar os seus personagens. Usando como extremo contraponto o agente Strickland (Michael Shanon) simboliza todo o espectro negativo e preconceituoso do americano patriota, que esconde na fachada de “pai de família do comercial de margarina”, ou ainda os membros do laboratório, como o falso moralista Fleming (David Hewlett). No centro disso tudo, a criatura anfíbia (Doug Jones) e seu momento de dor, clausura e descoberta.
Essa construção do roteiro também acerta ao mostrar, indo do subtendido ao explicito, o lado perverso dessa sociedade, do preconceito velado ao escrachado, a misoginia escondida, o xenofobismo, a paranoia e, como esse momento de um renascimento pós-segunda guerra mundial, escondia muita coisa negativa e doentia. Outro grande acerto é o roteiro nunca ser didático e nem truncado. Em momento algum o texto menospreza o seu expectador, e isso se fortalece por o filme sempre nos lembrar de que há um monstro anfíbio aqui também.
Hawkins é a força da história, comunicando-se de forma expressiva com a linguagem norte-americana de sinais e todo um trabalho de linguagem corporal e, juntamente com Doug Jones, dentro da roupa magnifica da criatura anfíbia, constroem uma das mais belas relações do cinema moderno. Sem barreiras e sem preconceitos. Shanon é o antagonista perfeito com a sua educação preconceituosa. Jenkins constrói uma figura melancólica por estar na velhice, vendo o seu fim chegar, e também por ver a sua obra artística se findar. Spencer faz a amiga certa para as horas certas.
A Forma da Água é tudo que faz Hollywood um berço para as histórias modernas. Bonito, eloquente e ousado. Guillermo del Toro produziu a sua fábula moderna de amor ao cinema que ele tanto ama e às coisas que lhe são tão apreciadas: os monstros e o amor puro entre os seres.
A Forma da Água
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Direção
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Elenco
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Fotografia
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Roteiro
Resumo
” – Guillermo del Toro produziu a sua fábula moderna de amor ao cinema.”