Bumblebee chegou aos cinemas e, mesmo depois dos trailers divulgados já indicarem que poderia vir coisa boa por ai, tinha muita gente torcendo o nariz para o filme, ou pelo histórico nada motivador da franquia Transformers, ou pelo excesso de Spin-off’s e derivados que a indústria do cinema insiste em derramar nas telonas ano após ano nos últimos tempos.
Mas, o fato é que basta você assistir os primeiros 10 minutos de Bumblebee para perceber que o filme não se assemelha em nada a antiga franquia de cinco filmes dirigidos por Michael Bay.
Bumblebee apostou numa história leve, absolutamente nostálgica, moderada em vários aspectos e com arcos de enredo muito bem inseridos e desenvolvidos. Divertido, e em certas partes emocionante, o filme, do agora fusca amarelo, chegou para ganhar seu espaço e revitalizar uma franquia há muito condenada pelos sucessivos erros dos longas anteriores.
Se você tem mais de 35 anos muito provavelmente deve ter assistido aos desenhos clássicos dos Transformers na década de 80. Caso seja mais novo, teve ter visto as outras inúmeras séries animadas que chegaram ao Brasil nos últimos 20 anos baseadas no universo destes robôs criados pela Hasbro como brinquedos e que ganharam um desenho animado para alavancar ainda mais a venda de bonecos.
O fato é que o desenho dos anos 80 serviu de base para construção do filme, que se passa no final desta década, mais precisamente em 1987, vinte anos antes dos eventos do primeiro filme da franquia principal. Bumblebee chega ao nosso planeta com uma missão vital para a sobrevivência dos Autobots e do próprio planeta Cybertron perante a tirania dos sempre cruéis Decepticons.
Os acertos do filme já começam por ai, primeiramente pelo visual, totalmente puxado do visual do desenho dos anos 80, o grande Optimus Prime, por exemplo, ganhou traços mais retos e uniformes em seu design deixando de lado o visual excessivamente metalizado e agressivo dos filmes anteriores.
Isso vale para todos os outros robôs, todos mantém um design muito próximo do mostrado no saudoso desenho, inclusive o próprio Bumblebee, que ao chegar a Terra assume a forma de um fusca amarelo exatamente como na animação dos anos 80.
É justamente na chegada do simpático robô amarelo o ponto de partida para o desenrolar da historia, que, aliás, flui numa cadência muito boa. Em momento algum percebemos uma quebra ou uma grande alteração do ritmo do filme, que se mantém interessante e agradável o tempo todo.
A narrativa se desenvolve através da amizade de Bumblebee e da garota Charlie (vivida pela carismática Hailee Stainfield), uma jovem de 18 anos que vive um momento complicado em sua vida tendo que lidar com uma dura perda em meio à dificuldade de se relacionar com sua família e com outras pessoas. Charlie possui um talento incomum para mecânica e, depois de encontrar um fusca aparentemente abandonado e conseguir consertá-lo, a garota é surpreendida pela revelação de que este fusca, claro, é o nosso herói, Bumblebee.
Diferentemente do que vimos no passado, não há arcos de enredo longos ou sem sentido para os personagens humanos, eles estão inseridos na história, têm seu papel relevante na mesma e seu desfecho encaixado dentro da engrenagem da trama principal. Em nenhum momento os Transformers são ofuscados pela presença humana na história.
Desta maneira o roteiro mostra como a relação de amizade entre Bumblebee e Charlie crescendo, mudando e fortalecendo ambos os personagens ao longo da trama. O laço é tamanho ao ponto de o desejo de proteger um ao outro desenvolver nos personagens sentimentos e atitudes que ambos desconheciam ter, sendo este fato vital para Bumblebee terminar sua missão, e para Charlie, literalmente, abandonar o fardo desnecessário que carregava por conta de uma tragédia familiar em seu passado.
Bumblebee é mostrado no trailer quase que como uma criança ingênua e assustada, o que havia me gerado dúvidas, afinal o Bumblebee que conheço é um soldado. Mas este fato é muito bem explicado pelo roteiro, inclusive ainda no primeiro ato que, além de apresentar os personagens e todo o seu contexto, serve para propor algumas explicações relevantes e necessárias, tudo de maneira prática e direta. Muitas coisas a respeito do próprio Bumblebee são apresentadas e explicadas neste primeiro ato. Mais um ponto positivo do filme.
Bumblebee ainda é o mesmo robô de “bom coração”, corajoso e atrapalhado que estamos acostumados. Combatente habilidoso e feroz no campo de batalha, ao mesmo tempo em que se mostra incrivelmente emotivo e engraçado, capaz de proporcionar momentos hilários (há uma sequência em especial no filme que é engraçadíssima!) ou de grande comoção.
A guerra em Cybertron é um pano de fundo, que serve de start para os acontecimentos do filme mas, sem que o assunto seja aprofundado, a visão que temos é que a causa Autobot é o lado correto do conflito e que a principio eles são nobres e justos. Optimus Prime retorna, como já dissemos, com um visual, em minha opinião, muito melhor, e com um perfil de líder centrado e justo, porém determinado e destemido, mas muito longe do impetuoso e por vezes desonrado Optimus dos últimos filmes da franquia.
Como antagonistas temos três Decepticons, dois deles com maior destaque, o cruel DropKick integrante de uma força tarefa liderada pela DecepticonShatter (que no Brasil recebeu uma boa dublagem feita pela atriz Paolla Oliveira). O empoderamento feminino está realmente presente em Bumblebee, com uma forte protagonista feminina e uma vilã principal igualmente bem feita, sem motivações pessoais, Shatter caça os Autobots refugiados como traidores que devem ser eliminados. Devotada a sua causa, e muita astuta, a caçadora usa da ganância e arrogância humana para atingir seus objetivos.
Falando em humanos temos o personagem Jack Burns, agente do conhecido Setor 7, interpretado pelo sempre boa praça John Cena, que assim como boa parte dos humanos teme Bumblebee por considerar uma ameaça àquilo que não entende. Seu personagem inicialmente caça Charlie e o Autobot para, depois, desempenhar uma função interessante na trama, mas sua notoriedade vai um pouco além, graças à presença marcante do ator em cena, marcadas principalmente pelo seu carisma.
O elenco ainda conta com John Ortiz como o cientista Dr. Powell, obcecado pelo conhecimento e tecnologia Decepticon, e por Jorge Lendenborg Jr, que vive Memo, um possível interessante romântico de Charlie, que vive com ela inúmeros momentos de diversão e perigo ao lado de Bumblebee. Falta à dupla uma química de casal, mas ao que parece isso é proposital, foge do clichê de que os personagens precisam sempre se envolver amorosamente.
Aliás, como podemos ver ao longo do filme e deste rewiew, uma série de estereótipos altamente presentes na franquia principal foram limados neste filme que inclusive fez questão de criar algumas situações dentro do enredo para deixar isto muito claro.
O roteiro entrega uma história boa, corretamente amarrada e muito mais contida do que estamos acostumados a ver num filme dos Transformers. Tudo é muito mais episódico e localizado. A ameaça existe numa escala menor e as soluções apresentadas são compatíveis com a demanda e o senso de urgência propostos pelo filme.
A fotografia é boa, trabalha bem a paleta de cores e tudo é muito claro e visível mesmo as cenas noturnas. O figurino e a ambientação são muito bons, passam realmente a sensação de que estamos acompanhando uma história no final dos icônicos anos 80, sensação que fica ainda mais imersiva com a trilha sonora que faz questão de reproduzir grandes sucessos da época.
Os efeitos, em minha opinião, funcionaram bem e as cenas de ação são muito mais visíveis e bem orquestradas. Mesmo nos momentos em que o combate se intensifica tudo é muito nítido em tela, de maneira em que conseguimos acompanhar perfeitamente os movimentos dos robôs.
Quem assina a direção é Travis Knight, um especialista em animação no estilo stop-motion, que inclusive foi indicado ao Oscar em 2015 pelo longa animado, “Os Boxtrolls”.
O roteiro ficou a cargo de Christina Hodson, que será a roteirista responsável por “Aves de Rapina”, filme da DC que será protagonizado pela Arlequina, a Mulher-Gato, e a Hera Venenosa, dentro do universo do Batman.
Michael Bay parece não querer largar o osso e assina como produtor do filme, que em nada se assemelha a franquia dirigida pelo mesmo (ainda bem!).
O filme funciona como prequel da franquia original, mas pode muito bem ser encarado como um reboot. Veremos como as próximas produções vão lidar com a cronologia e mitologia da saga. E sobre easter eggs e referências, é claro que temos muita coisa! Referências a clássicos dos anos 80 como o Clube dos Cinco, a presença de personagens clássicos da animação original em seu design da época, e até referencias a franquia de filmes de Bay.
Bumblebee
Elenco
Roteiro
Efeitos Especiais
Direção
3.5
Resumo
Bumblebee é uma aventura leve, divertida, cheia de ação e emoção, que se faz valer da nostalgia e do carisma de seus personagens para contar uma historia comedida, mas compromissada em fazer o que a gigantesca franquia de filmes há muito deixou de conseguir… encantar o publico.
Conheceu os quadrinhos (que carinhosamente chama de Gibi) no fim dos anos 80 e deles nunca mais se separou. Gamer old school, ávido devorador de bons livros, amante da sétima arte, comentarista de rádio. Escreve para uma comunidade de cultura pop, e é o mais recente membro honorário do Conselho de Elrond.