RPG

Dan Ramos, ilustrador e ex-sócio da Redbox Editora, fala sobre Financiamentos Coletivos, suas dificuldades e atrasos

Publicado há

em


Um dos grandes nomes do mercado de RPG nacional, o ilustrador Dan Ramos, foi às redes sociais e falou muito do que nós, consumidores de RPG, precisamos entender sobre a real dificuldade de empreender, via Financiamento Coletivo, no Brasil.

Uma das coisas mais recorrentes nas grandes comunidades virtuais de RPG do Brasil atualmente são bate-papos relativos aos financiamentos coletivos correntes ou finalizados. As reclamações vão desde: “as metas estendidas são poucas”, à “aff… meu livro foi entregue por uma equipe de entrega que não era dos ‘Correios'”. Tratando sobre o assunto, Dan Ramos, que é o ilustrador por trás de livros como Old Dragon, Space Dragon e Legião, da antiga Redbox Editora, hoje Buró Brasil, foi ao seu Facebook e falou sobre o tema, com a propriedade que só quem é do ramo pode ter.

Nós reproduzimos abaixo na íntegra, e com autorização, esta verdadeira aula sobre: ‘O que precisamos saber sobre a dificuldade de fazer um financiamento coletivo no Brasil’.


Sobre atrasos de financiamentos coletivos e tudo mais. Antes eu só olhava a turma acendendo as tochas e levantando os ancinhos. Mas agora não tenho vínculos (ao menos por enquanto) e posso dar minha opinião mais livremente.

EDIT: Já adianto logo que não tô tentando tirar seu direito de criticar ou ficar com raiva de perder dinheiro ou esperar anos. Só critique consciente e tente não ser também parte do problema, entende?

Se você era jogador(a) de RPG no Brasil nos anos 90, sabe como era uma merda. Tinha uma só editora publicando (porque a Abril arregou) e TODO MUNDO reclamava e se sentia mega órfão, sonhando em ver esse e aquele jogo em português e o mercado crescendo. As coisas mudaram, o mercado cresceu e hoje tenho certeza que cada um de vocês está participando de pelo menos um FC que atrasou (às vezes por anos) e está pra não viver, xingando muito. As editoras não se organizam, os produtores independentes são noobs, é um absurdo, meu rico dinheirinho jogado no lixo, yadda yadda.

Se tem uma coisa boa na democratização da publicação editorial (ou seja, FCs), é o poder de cada brasileiro subitamente passar para o outro lado dessa guerra e entender como as coisas funcionam. E amigue, a coisa é atroz.

Você vai lá, mostrar a todo mundo como se faz e produzir seu joguinho, seu suplemento, etc. Daí você tem uma série de dores de cabeça porque produzir no Brasil é caro, só pra começar. A gente, esses tais de artistas, revisores, diagramadores, tradutores e etc, tem que pagar caro pra se sustentar que nem você. E aí não podemos fazer pelo amor a seu livro. E você se dá conta que o público, veja só, quer produtos bem feitos, bonitos e organizados.

Depois, que coisa, o mercado está cheio. Você precisa se destacar, fazer um bom financiamento, com boas recompensas. Então você entra no mar de dificuldades que é montar um bom FC. A saúde mental vai pro saco, porque sua vida vira tirar orçamentos, fazer cálculos, pensar em prazos, ver outras pessoas tomando pedrada e imaginando que está se colocando na linha de tiro, etc, etc.

Fora que o custo de produção, mesmo quando é mais barato, é alto. O motivo é: quem produz RPG é uma formiguinha dentro de um monte de mercados já combalidos (jogos de tabuleiro, editorial) e ainda menor diante do todo (games, cultura pop). É o nicho do nicho. Então, não só seu alcance é menor, mas você paga mais caro. Sua tiragem, mesmo muitas vezes alta pra você, é quase nada em comparação ao livro de literatura mais chumbrega. As gráficas e fornecedores de material te jogam láááá pro fim da fila. Aí, você é ninguém no jogo do bicho. Qualquer imprevisto, tu fica na mão.

Aí o papel aumenta de preço. Ou o petróleo, ou o dólar (ou um aumenta em consequência do outro). Lembra aquele orçamento que você pegou meses atrás, antes de iniciar o projeto? Então… tenho uma má notícia. Pior: muitas vezes isso acontece DEPOIS que você já terminou a campanha — se prepara pra tirar do bolso. Isso sem falar com literalmente milhares de outros contratempos que podem fazer seu projeto atrasar por meses, ou até anos. Há maneiras de evitar e se resguardar, mas muitas vezes você é novo no negócio, ou não tem os contatos certos, ou confia em pilantras, ou simplesmente dá muito azar mesmo. Isso porque eu nem falei de impostos, logística, etc. Capitalismo selvagem.

Muito tempo atrás uma amiga minha deixou meio mercado furioso porque disse que boa parte de nós era composta de amadores bem-intencionados. Eu também senti o ego doer na época, mas já pouco depois eu sabia que ela tinha razão. No fim das contas, peixinhos nesse oceano gigante. Sendo que o público é um dos mais exigentes.

Claro que um dia, o país saindo dessa crise horrorosa, as coisas mudem. Nesse caso, vai ter muito mais prazos cumpridos que o contrário. Mas hoje? Difícil.

“Ah, mas se não conseguem fazer direito, não façam”. Beleza. Aí a gente volta pro tempo que só uma ou duas empresas enormes faziam, e todo mundo se dá mal.

Então, estou defendendo “cagadas” de editoras e estúdios? Não sei. Mas talvez, se teve saco de ler até aqui, você pare mais um pouco pra pensar no lado de quem produz. Até porque, salvo casos de gente sem vergonha que com certeza tem por aí, a maioria dos produtores e produtoras quer que o mercado cresça, quer contribuir com bons jogos para você, lucra quase nada com isso e mal consegue colocar a cabeça no travesseiro à noite quando não consegue cumprir.

Como diria Joyner Lucas, toda história tem dois lados, e agora você sabe o meu


Você pode ver essa, e outras, publicações do Dan Ramos no seu Facebook. Vale a pena conferir as artes do cara. São animais! Quem sabe até encomendar uma arte daquele seu personagem da campanha atual, sei lá. O cara é bom, vai por mim. 😉

Acompanhe mais novidades nas nossas redes sociais:
Facebook | Instagram | YouTube | Twitter


Clique para comentar

Mais Lidos

Sair da versão mobile