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Jaguareté | Quem não tem ‘Masmorras & Dragões’ se aventura com ‘Trilhas & Onças’

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Prepare seus equipamentos e acalme suas divindades. O paîé na terceira árvore da trilha do rio tem uma missão para vocês, jovens aventureiros! Porque dessa vez, nosso Mestre dos Magos não é um gnomo baixinho, mas o sábio da aldeia que comunga com os espíritos.

O Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) criou um RPG ambientado logo nos primeiros tempos de contato entre os nativos sul-americanos e os ocupantes europeus, instalando a experiência vivida pelas culturas ameríndias no processo de fundação da sociedade colonial do século XVI. Segundo a diretora do MAE, Márcia C. Rosato, um amplo trabalho de pesquisa foi exigido. Expressões corporais e faciais, vestimentas, encantos, herbalismo, criaturas e muito mais são de cuidado e esmero que dão gosto de ver. E, diria eu, muito recompensado. As ilustrações e até mesmo a forma de escrita evocam, do fundo de nossas mentes, o ambiente do descobrimento da terra que viria a ser nosso Brasil. O nome não poderia ser mais propício a este choque de culturas. Apresento-lhes Jaguareté: O Encontro.

Para cumprir a legislação que determina o ensino da cultura e história indígena nos currículos, os idealizadores do projeto se dedicaram a educar usando a poderosa ferramenta da interpretação. O livro inicia como a maioria dos livros de RPG: introduzindo o cenário, o que é RPG (que você pode ler AQUI), contando um pouquinho de história do Brasil e mostrando um pouco da cultura e filosofia da sociedade indígena. E mais: inclui um pequeno glossário dos termos indígenas, como curumim (menino) e paîé (pajé).

Com citações de poetas portugueses, indígenas e brasileiros surgindo entre as páginas, o livro vai discorrendo sobre o cenário, com sua geografia e sua história, aprofundando uma visão incomum do século XVI na Terra de Vera Cruz. Normalmente, vemos a história do Brasil contada num ponto de vista europeu, colonizador e com leves menções aos impactos causados à sociedade indígena. Mas, dessa vez, o Museu de Arqueologia e Etnologia nos trás o olhar indígena sobre os acontecimentos, sua cosmologia, sua filosofia e suas impressões.

Usando os d% (ou dois d10) para utilizar a mecânica simples do jogo, o sistema conta com algumas peculiaridades. Em vez de raças e classes, como normalmente vemos nos cenários fantásticos, temos povos (bem a gosto de Crônicas de Avalon, que se passa na Velha Britânia), permitindo aos jogadores ser um tupinambá, guaianá ou europeu, com sugestões de nomes e até um pouco de ganchos históricos e relações entre eles para facilitar a criação de cada personagem e a interpretação (que, afinal, é o objetivo de todo RPG).

A ficha de personagem é mais simples que o clássico Dungeons & Dragons e sua série de valores e cálculos, lembrando um pouco mais as fichas de Storyteller. Temos quatro atributos (físico, vitalidade, consciência e expressão) e uma série de capacidades de cada povo (que vão de arco e sobrevivência para os indígenas até teologia e espadas para os europeus) que vão podem ser gastas no decorrer do dia. Como não existem classes como normalmente, Jaguareté: O Encontro nos presenteia com os Caminhos de cada povo: duas opções de caminhos que testam os limites do personagem que podem agir como se fossem classes, uma mais combativa (Vingança, Guerrreiro e Conquistador) e outra voltada ao seu lado espiritual (Maraká, Iangrê e Salvação) que definirão as habilidades de cada personagem conforme sobem de nível (que vão do 1° ao 6° em cada Caminho), com códigos de ética próprios para cada um. Os personagens também podem ter desvantagens, chamadas perturbações, que guiam as interpretações (e que agir contra elas podem fazer com que o personagem desça de nível).

Com fichas de exemplo de personagens históricos (como o padre José de Anchieta) e um incrível bestiário de animais e espíritos, Jaguareté: O Encontro ambienta de forma magistral o cenário da colonização brasileira com uma série de desafios para os jogadores. Mas em vez de corredores de masmorras subterrâneas para enfrentar o dragão guardando seu tesouro, os jogadores percorrem trilhas obscuras nas matas para enfrentar o próprio Jaguareté. Há todo um apêndice de ideias para aventuras no fim do livro, fornecendo ganchos e dicas para os mestres que desejam iniciar suas campanhas nas Terras Baixas da América do Sul nos primeiros momentos da colonização. A estes eu apenas digo: boa sorte, bom jogo e nunca recusem o tabaco de um paîé!

Várias bibliotecas do país receberam versões físicas do jogo. Confira AQUI se algumas delas está perto de você.

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